Busca por imóveis longe de áreas alagáveis e disponibilidade limitada desafiam mercado
Marcel Lovato
Vale do Taquari
A força da última grande enchente devastou áreas inteiras no Vale, reforçou o movimento de migração observado desde setembro e a busca por imóveis em locais afastados do Rio Taquari. Em paralelo, fez com que áreas antes consideradas ‘livres de inundação’ perdessem tal status, o que complexificou o cenário.
Conforme a corretora da Porto Seguro Empreendimentos Imobiliários, Angélica Dalla Vecchia, a demanda é tão alta que há centenas na fila de espera. Diferente do ano passado, quando a água era a única preocupação, desta vez os deslizamentos de terra em série contribuíram para acelerar a fuga de regiões de risco. Logo, em pouco tempo as opções escassearam e a perspectiva não é de melhora a curto prazo.
Além de moradores de Encantado, foi registrado um aumento considerável de pessoas vindas de Muçum e Roca Sales. “A situação é delicada. Vemos diariamente pessoas desesperadas atrás de um local para recomeçar, mas não conseguimos ajudar a todos. Sofremos juntos”, comenta Angélica. Localizada no Centro, a imobiliária também foi inundada.
Mudança de hábito
Há procura por imóveis residenciais ou comerciais de todos os tipos. Também houve alterações nas preferências de localização. Atualmente, os primeiros requisitos considerados são a distância em relação ao Rio Taquari, encostas e/ou declives, a garantia de ‘tranquilidade’. Embora ainda importante, o tempo de deslocamento para o trabalho, escola e demais serviços fica em segundo plano.
Em relação aos valores, Angélica destaca que os imóveis já disponíveis antes da enchente de maio, seja para venda ou aluguel, não tiveram reajustes. Contudo, houve acréscimo naqueles que chegaram à imobiliária após esse período. Ao mesmo tempo, há muitos imóveis à venda ou disponíveis para locação, especialmente nas áreas suscetíveis às inundações. Porém, diante das circunstâncias, a tendência é de que sigam desocupados.
Outras imobiliárias relatam também que proprietários têm solicitado a saída de inquilinos, ainda que se tratem de casos pontuais. Neste contexto, os donos tiveram a residência principal atingida de alguma forma, até mesmo totalmente, e recorrem às então locações. Mais um fator que contribui para agravar o problema.
Recomeço
Natural de Porto Alegre, a aposentada Marisa Bassani (75) morou por mais de 50 anos em Muçum, defronte à Praça Cristóvão Colombo. Até setembro, a residência em que viveu com o marido nunca havia sido atingida. Segundo ela, na época “foram 14 horas com a água no pescoço”. Resgatados, vieram morar em Encantado, perto da filha. Havia o receio ficar sem um imóvel. A casa na cidade vizinha foi reformada e colocada para aluguel, mas acabou atingida outra vez. Não deverá ser consertada novamente. “A gente estranha né? Vivemos a vida toda em um lugar, de repente temos de sair. É complicado! Por outro lado, agora estamos tranquilos”, relata.
Visão do Creci
Ao Antena, o Conselho Regional de Corretores de Imóveis (Creci-RS) destacou que a baixa disponibilidade na Região Alta já é natural, mas ganhou ainda mais evidência após os eventos catastróficos. Para suprir a demanda, a médio e longo prazo, uma das saídas é a construção de conjuntos habitacionais, o que depende de investidores, de desapropriações e afins.
Outra orientação, na medida do possível, é buscar financiamento para adquirir um imóvel, pois o leque se mostra mais amplo na comparação com aluguéis e as condições são mais atraentes. A entidade ainda sugere sempre a conversa com corretores credenciados, a fim de garantir uma negociação mais justa.